Defensoria mineira investe no acolhimento e na inclusão para transformar trajetórias de adolescentes em medida socioeducativa 

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Romper barreiras e abrir portas para novas oportunidades. Esse foi o espírito que marcou o evento promovido pela Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG), nesta quarta-feira (17/12), dedicado à promoção da inclusão social, ao fortalecimento do exercício da cidadania e à responsabilização educativa de adolescentes em cumprimento de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto (MSE), especialmente na modalidade de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC). 

A programação teve início com a assinatura simbólica de um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) entre a DPMG e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). A parceria viabiliza a criação de postos de atividades em unidades da Defensoria Pública na capital, destinados ao acolhimento de adolescentes que cumprem MSE na modalidade PSC. O acordo tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento pessoal e social desses jovens, favorecer sua integração à comunidade e ampliar as possibilidades de ressocialização e inserção em ambientes institucionais e profissionais. 

Assinatura simbólica do ACT pela subdefensora pública-peral Administrativa, Karina Rodrigues Maldonado, representando a defensora pública-geral Raquel Gomes de Sousa da Costa Dias e pelo secretário Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, André Abreu Reis – Fotos: Bryan Carvalho/DPMG 

Durante a cerimônia, a subdefensora pública-geral Administrativa, Karina Rodrigues Maldonado, destacou a força do trabalho em rede e da atuação colaborativa, capazes de gerar resultados mais amplos e efetivos. Segundo ela, o trabalho com adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas produz impactos positivos que vão além do indivíduo, refletindo no futuro e no fortalecimento da sociedade como um todo. 

Subdefensora pública-geral Administrativa, Karina Rodrigues Maldonado 

Karina Maldonado ressaltou ainda a vocação da Defensoria Pública para atuar para além da esfera estritamente jurídica. “Temos um ferramental jurídico muito expressivo, mas nem sempre conseguimos alcançar problemas que, muitas vezes, são de ordem social. Essa atuação vai nos permitir ir além do jurídico, acolhendo esses jovens em nossa instituição e transformando, de maneira concreta, a vida deles”, afirmou. 

Ao encerrar sua fala, a subdefensora colocou a Defensoria mineira à disposição para ampliar parcerias. “Podemos fazer mais e melhor, não somente por meio deste ACT, mas também dos próximos que virão”, completou. 

O secretário municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, André Abreu Reis, ressaltou a Defensoria Pública como importante parceira do Município em diversas iniciativas voltadas à garantia de direitos da população e elogiou o protagonismo da Instituição no acolhimento de jovens educandos. 

Secretário municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, André Abreu Reis 

“As políticas públicas têm uma rigidez muito grande e, muitas vezes, é difícil para a administração pública modificá-las. Existem lacunas que precisam ser preenchidas, o que exige recriar e fazer o novo. Por isso, essa iniciativa da Defensoria é tão importante. Que venham outras instituições com esse formato de acordo, para que possamos promover a inserção desses jovens e trabalhar com eles da melhor forma possível”, destacou. 

Experiência exitosa em Betim 

Na sequência do evento, foi realizada a palestra “A relevância do acolhimento de adolescentes em cumprimento de Medidas Socioeducativas pela DPMG”, ministrada pelo defensor público Maxnei Gonzaga, coordenador local da Unidade da DPMG em Betim; pela coordenadora da Defensoria Especializada dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes – Ato Infracional, Ana Paula Coutinho Canela e Souza; e pelo doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais, estagiário de pós-graduação e coordenador da política pública implantada na Unidade, professor José Carlos Batista.  

Maxnei Gonzaga, Ana Paula Coutinho Canela e Souza e José Carlos Batista 

Em 2018, a Unidade da DPMG em Betim iniciou o projeto “Construindo Caminhos: um projeto de medidas socioeducativas para adolescentes em situação de vulnerabilidade”. A inciativa surgiu quando a Defensoria Pública se voluntariou como instituição para acolher jovens e adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, o que era, até então, uma lacuna no município.  O projeto passou uma pausa durante a pandemia da Covid-19 e retornou em 2023 na condição de política pública, a partir de um Acordo de Cooperação Técnica com a Prefeitura de Betim, com o intuito de institucionalizar a ação. 

A iniciativa é voltada para adolescentes e jovens que cometeram atos infracionais e precisam prestar serviço à comunidade como forma de cumprimento da medida socioeducativa. A maioria desses jovens são negros e se encontram em situação de vulnerabilidade. Por isso, o objetivo é, em primeiro lugar, criar um ambiente de acolhimento para que esse jovem possa se reintegrar na sociedade de forma plena e com oportunidades.  

Ao longo dos últimos anos, a Unidade acolheu dez adolescentes, oferecendo atendimento especializado, escuta qualificada e acompanhamento integrado dos jovens e de suas famílias, em articulação com os serviços socioassistenciais e com políticas setoriais de educação, saúde, trabalho, cultura, esporte e lazer. 

Além de atividades administrativas, como digitalização de documentos, organização de arquivos e apoio interno, os adolescentes são incentivados à educação digital e profissional, com capacitação em ferramentas como Word, Excel, PowerPoint e Canva. Também são promovidas rodas de conversa — algumas organizadas pelos próprios adolescentes — sobre temas como juventude e criminalidade, projetos de vida, família e educação profissional. 

Esporadicamente, são realizadas atividades de lazer e artístico-culturais, como sessões de cinema, incentivo à leitura e participação em jogos de futebol em estádios, entre outras iniciativas. 

Durante a palestra, o idealizador do projeto, defensor público Maxnei Gonzaga, falou sobre como o processo é capaz de proporcionar aprendizado não só para o jovem, mas também para aquele que acolhe. “O mais interessante é que ao acolher essas pessoas a gente aprende mais do que ensina e isso vai acontecendo no dia a dia, cultivando uma relação de proximidade, conhecendo as histórias desses jovens, os relatos, as vivências e quebrando as barreiras do preconceito que se possa haver em relação a eles”, afirmou. 

Maxnei Gonzaga também reafirmou a importância da expansão do projeto para outras Unidades da Defensoria, destacando que a iniciativa está alinhada à missão constitucional da Instituição de promover os direitos humanos e o exercício da cidadania de jovens e adolescentes. 

Em sua fala, o coordenador do projeto, José Carlos Batista, evidenciou a necessidade de que a política pública seja bem desenvolvida, para que não acabe contribuindo ainda mais com a exclusão e desigualdade social na vida do jovem. De acordo com o professor, o momento atual é fundamental para uma estruturação ainda maior do projeto, por meio do diálogo, troca de experiência e escuta ativa. “Toda política pública tem como alvo a transformação de uma realidade e é por isso que ao lidar com esse público, se faz necessário ter uma atuação sensível às suas vulnerabilidades”.  

Professor José Carlos Batista 

Para coordenadora da Defensoria Especializada dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes – Ato Infracional, Ana Paula Coutinho Canela e Souza, o principal aspecto ao lidar com indivíduos em cumprimento de medida socioeducativa é fazer com esse jovem possa ousar sonhar novamente. “Quando a gente consegue atuar, criar oportunidades para que aquele indivíduo consiga enfrentar barreiras já pré-estabelecidas por uma série de marcadores, conseguimos de fato fazer com que eles rompam esse obstáculo e oferecer a eles oportunidades de florescer os seus infinitos potenciais”, afirmou.  

Defensora pública Ana Paula Coutinho Canela e Souza 

Ao fim da palestra, foi divulgado um vídeo produzido pela equipe das Redes Sociais da DPMG, com depoimentos de jovens educandos que passaram pela Unidade de Betim, onde compartilharam um pouco mais de sua trajetória e experiência participando do projeto “Caminhos de Reconstrução”.  

Capacitação  

Ao final do evento, foi realizada uma capacitação interna voltada aos membros e servidores da Instituição, com foco em procedimentos, fluxos e boas práticas para o acolhimento de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas. 

Responsável pela abertura do treinamento, a coordenadora metodológica do Serviço de Medidas Socioeducativas da PBH, Flávia Soraya de Castro, destacou os desafios enfrentados no acolhimento de adolescentes em PSC, especialmente relacionados ao estigma, ao preconceito e à reprodução de práticas punitivas. Segundo ela, o trabalho socioeducativo exige um exercício constante de escuta, empatia e revisão de olhares para transformar a prestação de serviço em um espaço de construção de cidadania. Ao ressaltar a importância da atuação da Defensoria nesse processo, Flávia de Castro afirmou que a iniciativa representa a busca para ressignificar a relação dos adolescentes com o sistema de Justiça. “Esse jovem precisa acessar a instituição pública a partir de outra lógica, que não seja a da acusação e da punição, mas da orientação, do cuidado e da garantia de direitos”, afirmou.  

Flávia Soraya de Castro 

Na sequência, a encarregada de dados da DPMG, Rafaela Alvarenga Figueiredo, conduziu a capacitação sobre privacidade e proteção de dados pessoais dos adolescentes atendidos pelo acordo. A servidora explicou que os dados pessoais são uma extensão da personalidade e devem ser tratados como um direito fundamental, especialmente quando se trata de jovens em situação de vulnerabilidade. De acordo com Rafaela Figueiredo, a instrução deve garantir que todos os envolvidos compreendam a importância do uso responsável das informações, evitando exposições indevidas. “Esses adolescentes só entregam seus dados à Defensoria porque confiam na instituição, e essa confiança precisa ser preservada com o máximo de cuidado e responsabilidade”, ressaltou. 

Encarregada de dados da DPMG, Rafaela Alvarenga 

Em resposta à consulta feita pela Coordenadoria de Projetos, Convênios e Parcerias (CooProC), oito defensoras e defensores públicos que atuam em Belo Horizonte manifestaram interesse em acolher adolescentes em seus órgãos de execução. O acolhimento está previsto para iniciar nos primeiros meses de 2026. 


Alessandra Amaral e Davison Henrique – Jornalistas/DPMG e Jenifer Costa, estagiária sob a supervisão da ASCOM.