Justiça Militar poderá aplicar acordo de não persecução penal: atuação da Defensoria Pública de Minas Gerais garante avanço inédito no STJ
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Por meio de habeas corpus ajuizados pela Defensoria Pública de Minas Gerais, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu, de forma inédita, a possibilidade de aplicação do acordo de não persecução penal (ANPP) a crimes de competência da Justiça Militar. A decisão das duas turmas criminais da Corte marca um avanço importante na efetivação de direitos fundamentais também no âmbito da Justiça Militar
A decisão, proferida em 8 de agosto pela 5ª e 6ª Turmas do STJ, teve origem em dois habeas corpus apresentados pela Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG).
O acordo de não persecução penal foi instituído pela Lei 13.964/2019 (conhecida como “Lei Anticrime”) e permite, mediante o cumprimento de condições e a confissão do delito, que o investigado evite o prosseguimento do processo penal. Até então, não havia consenso sobre sua aplicação no âmbito da Justiça Militar, especialmente para delitos previstos no Código Penal Militar.
Decisão garante ANPP para crimes militares de menor potencial ofensivo
Nos casos analisados, o STJ aplicou interpretação sistemática entre o artigo 28-A do Código de Processo Penal (CPP) e o artigo 3º do Código de Processo Penal Militar (CPPM), que prevê a aplicação subsidiária do CPP nos casos omissos da legislação castrense (conjunto de leis e regulamentos que governam as Forças Armadas e a Justiça Militar).
A 5ª Turma analisou o caso de um militar processado por falsificação de documento (artigo 311 do Código Penal Militar), a quem havia sido negada a oportunidade de audiência para oferecimento do ANPP. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais havia seguido entendimento do Superior Tribunal Militar, que entende não ser possível aplicar o acordo a crimes militares. No entanto, o relator no STJ acolheu os argumentos da Defensoria e reconheceu que o ANPP não é incompatível com o rito militar, desde que respeitados os princípios constitucionais da proporcionalidade e individualização da pena.
“Vale notar que o Ministério Público de origem ofertou ANPP ao paciente, reconhecendo a aplicação do referido instituto à Justiça Militar e a sua suficiência como resposta penal ao fato imputado”, destacou o relator.
Precedente reforçado na 6ª Turma
Já a 6ª Turma analisou o caso de um militar processado por abandono de posto (artigo 195 do CPM). Neste processo, o Ministério Público chegou a oferecer o acordo, mas o Conselho Militar indeferiu sua homologação. O ministro relator acolheu o habeas corpus da DPMG e reforçou que, conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal, não há restrição legal à aplicação do ANPP, desde que observados os requisitos legais e a compatibilidade com o caso concreto.
“Institutos como o ANPP podem ser admitidos no processo penal militar, desde que não contrariem disposições específicas do rito castrense”, afirmou o ministro.
Atuação estratégica da Defensoria Pública
As decisões do STJ foram influenciadas pela atuação estratégica da Defensoria Pública de Minas Gerais na promoção de direitos também no sistema de justiça militar. Ao ajuizar os habeas corpus, a instituição buscou garantir o tratamento igualitário de militares acusados de delitos menos graves, estendendo a eles os mesmos benefícios processuais já aplicáveis na justiça comum.
Com os julgamentos, abre-se caminho para a consolidação da jurisprudência sobre a aplicabilidade do ANPP na Justiça Militar, promovendo uma justiça mais célere, proporcional e eficiente.
Alessandra Amaral – Jornalista DPMG.