Defensoria Pública mineira discute inclusão das mulheres pretas em roda de conversa

Por Assessoria de Comunicação em 25 de julho de 2022

Roda de conversa teve a participação de um público divesificado – Foto: Alfredo Júnior

Pela primeira vez no calendário oficial da Defensoria Pública de Minas Gerais, o contexto da saúde e as violências cometidas contra as mulheres pretas foram temas de debate na sede da Instituição.  

Iniciativa da Escola Superior da DPMG, o assunto foi amplamente discutido na manhã desta segunda-feira (25/7), Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-americana e Caribenha e Dia Nacional de Tereza de Benguela. 

O evento contou com a participação da defensora pública-geral Raquel da Costa Dias, da assessora da Corregedoria-Geral da Instituição, defensora pública Cibele Cristina Maffia Lopes, e teve a coordenação da defensora pública e coordenadora estadual de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres, Samantha Vilarinho Mello Alves, e também a defensora pública, lotada na Defensoria do Juizado Especial Criminal, Marolinta Dutra. 

Com a presença de servidoras e servidores, convidadas e convidados, integrantes da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) e de um grupo de homens, mulheres e crianças pertencentes à tribo indígena Warao, da Venezuela, que vivem em Belo Horizonte desde 2016, o evento apresentou reflexões sobre a data. 

O Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-americana e Caribenha teve origem em Santo Domingo, na República Dominicana, local onde cerca de 300 representantes de 32 países se reuniram, com o objetivo de denunciar a opressão e as aflições sofridas pelas comunidades negra e indígena. 

Celebrado no Brasil desde 2014, na Defensoria Pública o Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-americana e Caribenha e o Dia Nacional de Tereza de Benguela foram celebrados num formato diferente: uma roda de conversa onde a plateia interagiu a todo instante com os integrantes da mesa debatedora, que teve a participação da enfermeira sanitarista Miriam Maria Gonçalves Chaves e da advogada e co-fundadora da Casa das Pretas Doula, Luísa Helena Martins.  

Defensora pública-geral Raquel da Costa Dias abre a roda de conversa no auditório da DPMG – Fotos: Marcelo Sant’Anna/DPMG

Ao abrir o evento, a defensora pública-geral Raquel da Costa Dias inspirou seu discurso no trecho do livro “O Momento da Voar”, da escritora norte-americana Melinda Gates. Raquel Dias destacou parte da obra para retratar a “temática da mulher preta e do cuidado que ela deve ter com sua saúde e da defesa que todos nós – principalmente instituições públicas – devem ter para que ela não se deixe em situações de violência”.  

Em parte do texto destacado e lido, Raquel da Costa Dias chamou a atenção para a referência à mulher africana feito pela autora do livro, mas que, segundo ela, tem sinergia e contexto com a realidade de vida da mulher brasileira cuja condição é bastante parecida.  

Em sua obra, a autora diz que ”durante 20 anos viajei pelo mundo trabalhando pela fundação que criei com meu marido Bill. Em minhas viagens, descobri que centenas de milhões de mulheres querem decidir por si mesmas: se e quando terão filhos. Mas não podem. Não tem acesso a anticoncepcionais. E existem muitos outros direitos e privilégios negados às mulheres e às meninas: o direito de decidir se, quando e com quem se casar. O direito de frequentar uma escola, de receber um salário. De trabalhar fora de casa. De sair de casa. De gastar o próprio dinheiro. Organizar o seu orçamento. Abrir um negócio. Fazer um empréstimo. Ter uma propriedade. Divorciar-se do marido. Consultar-se com um médico. Candidatar-se a um cargo. Andar de bicicleta. Dirigir um carro. Fazer faculdade. Estudar computação. Encontrar investidores. Todos esses direitos são negados às mulheres em algumas partes do mundo e, às vezes, até por lei. Mas quando isso tudo é permitido por lei, muito ainda nos é negado pelos preconceitos culturais. Então que, este momento de pausa e todos os momentos que a gente tenha para discutir esse assunto, nos ajude a mudar essa realidade tão triste ainda para nós, mulheres. Para nós mulheres pardas, negras ou de todas as mulheres. Porque todas nós, em algum momento da nossa vida, já fomos vítimas de preconceito de gênero”

Lido o trecho, a defensora-geral concluiu dizendo que a Defensoria Pública – enquanto instituição de acesso a direitos – seja um agente transformador dessa realidade. “Que a gente consiga, a cada tijolinho deixado, mudar a realidade que nos cerca e que, cada vez mais, mulheres ocupem os seus espaços e possam decidir por si mesmas“, disse Raquel da Costa Dias.  

Samantha Vilarinho, Miriam Chaves, Luísa Martins e Marolinta Dutra

Notificações alarmantes 

Com muitas experiências vividas ao longo dos anos nos postos de atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS) e dados estatísticos, a enfermeira e sanitarista Miriam Chaves chamou a atenção para as notificações de violência por sexo ocorridas nos últimos 6 anos: 72% delas, envolvendo a população feminina entre 10 e 50 anos.  

Essa violência, segundo a sanitarista, é relacionada à violência física, psicológica e moral, social, por negligência e abandono. E boa parte dos dados remete, especificamente, às mulheres negras. Miriam Chaves alertou para a necessidade urgente de mudança dessa triste realidade a partir de uma palavra: equidade. E justificou: “É preciso tratar de forma diferente os desiguais. E a Defensoria Pública tem um papel decisivo nessa construção”, ressaltou.                

Com o tema violência obstétrica, a advogada Luísa Helena Martins elogiou o formato roda de conversa adotado pela Defensoria Pública. Com frases do tipo “Não estamos ocupando um lugar e sim fazendo parte de um lugar que também nos pertence”; “Não temos privilégios e sim direitos”; “Precisamos de reparação de um dano histórico, sem que nos sintamos impostores”; “Minha história não começou com a escravidão”. E ainda, “Negros precisam ter acesso a lugares em que pessoas brancas têm a chave”, ela despertou os participantes a pensar sobre as muitas violências praticadas contra a mulher negra e indígena. 

Alertou também quanto aos procedimentos abusivos adotados até os dias de hoje e sobre uma mudança radical em números apontados pela especialista em amamentação e pesquisadora de estudos raciais. “66% das mulheres que sofrem violência obstétrica são negras. Fruto do descaso com as mulheres negras e que não têm um pré-natal digno, são tocadas sem consentimento ou de forma excessiva”, afirmou Luísa Martins.  

A advogada chamou ainda a atenção para a necessidade urgente de mudança desse triste cenário a partir da condução de informações aos lugares que, de fato, possam mudar esse contexto envolvendo mulheres negras, maioria avassaladora na sociedade brasileira.  

“Para mudar nossa sociedade é preciso que estatísticas e números dessa natureza cheguem aos lugares que, de fato, precisam chegar”, destacou Luísa. Ela parabenizou a Defensoria pela iniciativa. “Essa é uma roda que demonstra o compromisso da Defensoria com a sociedade. Ela se afirma perante uma sociedade que tem uma grande pluralidade. Que quer ouvir também. Roda de conversa é um outro modelo de palestra em que as pessoas também participam durante o evento. Então, elas trazem também as suas indignações, seus relatos. Isso é muito importante para você saber quais as necessidades da população”, finalizou.  

Participante ativa e atenta às discussões, a representante da tribo Warao, Yolis Lyon, que estava na plateia ao lado do cacique Ivan Morais, destacou a importância da abordagem do tema para as mulheres pertencentes à população indígena.  

“Neste dia precisamos destacar a importância de a mulher ter representatividade e discutir o assunto. Não podemos continuar a aceitar nenhum tipo de violência – nem estética, nem física e nem psicológica – e daí a importância de palestras como esta e de nos posicionarmos como mulheres, enquanto liderança do nosso povo, para acabar com esse tipo de violência que existe contra nós por sermos mulheres” ressaltou Yolis, que é jornalista e há 16 anos vive no Brasil.      

Ao final, foram respondidas perguntas de internautas que participaram via chat do canal da Defensoria de Minas no YouTube. Clique aqui para assistir a roda de conversa na íntegra. 

Jacques Leal – Jornalista/DPMG 

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