Geicilene ficou sem pagar as taxas de condomínio durante 9 anos. Dez anos antes, ela se mudou para um apartamento adquirido por sua mãe, por meio de política pública de acesso à moradia, no bairro Jardim Vitória, em Belo Horizonte. Cerca de um ano depois, sua mãe faleceu. Desempregada, vivendo de auxílio do Governo e com uma filha de dois anos, Geicilene passou a ter que escolher: “ou a gente comia, ou eu pagava as contas”.
A dívida com o condomínio foi aumentando e quando Geicilene tentou negociar já estava em R$ 25 mil, “impossível de pagar”, segundo ela. A empresa responsável pela negociação pediu R$ 5 mil à vista e o restante em parcelas mensais de R$ 700. Não aceitaram a proposta de Geicilene: R$ 2 mil à vista e o restante dividido em mais meses.
Depois disso, segundo ela, “foram só juros, em cima de juros e mais juros”, e o montante da dívida avançou para R$ 30 mil.
Agora, o imóvel foi leiloado para pagar as taxas. Geicilene lamenta ter que deixar o apartamento. “Quando viemos para cá, minha filha estava com dois anos. Aqui é seguro, posso sair para trabalhar tranquila que ela ficará em segurança até eu voltar”.
Por que se deve pagar o condomínio?
Cleide Aparecida Nepomuceno, defensora pública da Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais (DPDH) e que atua em diversos casos de moradia, posse e regularização fundiária, explica que a taxa de condomínio é uma dívida do imóvel. Se o condomínio não for pago, o morador pode perder o imóvel, para que seu valor sirva como quitação das dívidas.
Ela continua esclarecendo que “embora o Código Civil estabeleça que o bem de família, que o único imóvel de moradia da família não pode ser penhorado, essa regra não vale para dívidas de condomínio e IPTU, porque essas dívidas são do próprio imóvel”.
Quem não paga taxa de condomínio pode perder o imóvel. Essa é uma das piores penalidades por não pagar condomínio, já que o morador pode deixar de ter a sua casa própria.
Além disso, as taxas de condomínio são usadas para pagar serviços importantes para o dia a dia de todos os moradores, como segurança, conta de água, manutenção das áreas comuns do prédio, impostos e gastos com produtos de limpeza, por exemplo.
Muitas pessoas procuram a Defensoria Pública quando o imóvel já está para ser leiloado e o débito está alto, mesmo sendo imóveis adquiridos pelo programa Minha Casa Minha Vida.
“Apesar da aquisição do imóvel ter sido por meio de uma política pública com subsídios públicos, isso não retira do morador a obrigação de quitar as despesas que formam o condomínio porque a moradia continua sendo uma mercadoria, bem como todos os serviços que são necessários para morar, como por exemplo, a taxa de condomínio. E, em nossa sociedade, para se ter direito a uma mercadoria deve-se pagar por ela”, observa a defensora pública.
Do direito de morar em apartamento
O pagamento da taxa de condomínio é um dever decorrente da conquista de uma moradia adequada. Para uma moradia ser adequada, não basta que tenha um teto. Ela deve ter acesso a serviços básicos de água, esgoto, energia elétrica e coleta de lixo.
Cleide Nepomuceno lembra que “todos deveriam ter uma moradia adequada, entretanto há pessoas que moram em ocupações [1] ou em assentamentos irregulares. [2] Tanto na ocupação como no assentamento irregular, os moradores não têm acesso a serviços públicos regulares, como água, saneamento básico e energia elétrica de qualidade. Também não têm direito a um endereço, à urbanização, com ruas asfaltadas e coleta de lixo, e não têm direito ao título de propriedade”.
Há famílias que conquistaram o direito de morar em lugares regularizados, com direito a um endereço e a serviços públicos regulares de água, saneamento básico e energia elétrica. Entretanto, esses direitos geram o dever de pagar por esses serviços. Nesses locais, as famílias têm o título de propriedade do imóvel, o que torna a moradia um bem de maior valor comercial, pois pode ser negociado por meio de financiamento em instituições financeiras.
“Por isso, é um dever cumprir com esse pagamento. Claro que podem existir fases de grande dificuldade financeira, mas deixar de pagar o condomínio pode fazer com que a família perca sua moradia e o seu bem”, alerta a defensora pública.
A Defensoria Pública está à disposição dos síndicos de condomínios e dos condôminos para orientar e tentar uma solução mediada para conflitos dessa natureza.
[1] Ocupação: local cuja posse está sendo reivindicada pelo seu proprietário em um processo judicial e que por isso não há segurança da posse para o morador, pois ele pode ser despejado a qualquer tempo por uma ordem judicial a favor do proprietário.
[2] Assentamentos irregulares: locais que apesar de não ter ameaça de despejo como na ocupação, as famílias não possuem título de propriedade e muitas vezes não têm os serviços de água e luz regularizados e carecem de obras de urbanização como asfalto, obras de drenagem pluvial e coleta regular de lixo.
Alessandra Amaral – Jornalista DPMG.