Na semana em que se celebrou o Dia Nacional da Visibilidade Trans, a Defensoria Pública de Minas Gerais ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido de suspensão, de forma cautelar, da Lei Municipal nº 13.698/2022 de Uberaba/MG, com sua posterior eliminação do ordenamento jurídico.
O texto legal, aprovado pelo Plenário da Câmara Municipal, impõe que os banheiros públicos ou privados, instalados na cidade, devam ser de uso restrito a usuários de um mesmo sexo biológico, impedindo, assim, que pessoas transexuais e travestis utilizem o banheiro conforme sua identidade de gênero.
Após listar quais os banheiros são regidos pela norma, a Lei Municipal prevê sanções, que incluem a aplicação de multa de R$ 2 mil e a suspensão do alvará de licenciamento do estabelecimento ou de realização de eventos.
Conforme observa a Defensoria Pública na petição, a Lei Municipal, ao adotar o “sexo biológico” como único critério válido para o uso de instalações sanitárias na cidade, impede que pessoas trans, que assumem identidade de gênero diversa do sexo que lhes foi atribuído pelo nascimento, possam utilizar o banheiro masculino ou feminino em conformidade com o gênero com o qual se identificam e se expressam.
De acordo com a ADI proposta pela DPMG, a norma municipal apresenta vícios de inconstitucionalidade formal e material. Na petição, a Defensoria Pública atenta que os artigos da Lei estão em desconformidade com a Constituição Estadual de Minas Gerais, sendo necessário, por consequência, reconhecer a sua invalidade.
A Defensoria Pública argumenta que os dispositivos são materialmente inconstitucionais por violarem as prescrições da Constituição Mineira, sobretudo no que tange aos seus princípios fundamentais, que impõem o respeito à dignidade da pessoa humana e aos valores do pluralismo e da diversidade. A instituição afirma, ainda, que a Lei Municipal ofende o dever estatal de construir uma sociedade livre, justa e solidária, bem como de promover o bem de todos, sem preconceitos ou quaisquer formas de discriminação.
O pedido se fundamenta, também, na garantia de direitos fundamentais como a liberdade e a proteção contra tratamentos desumanos e degradantes. Com isso, descreve-se que a Lei Municipal promove um retrocesso, uma vez que reforça a marginalização de pessoas trans, já extremamente vulneráveis a violências e à exclusão social.
Relembra-se, por fim, que o Supremo Tribunal Federal (STF) assegurou às pessoas trans o direito de retificação de seus registros civis quanto ao prenome e ao gênero, tendo reconhecido, ainda, que atos de transfobia são puníveis como crime equiparado a racismo. Por essas razões, a Lei Municipal caminha na contramão da obrigação estatal de combate à discriminação e promoção de igualdade e cidadania.
Quanto à inconstitucionalidade formal, a Defensoria Pública afirma que a lei trata de matéria que não pode ser alvo de legislação municipal, e ainda, prevê atribuições e deveres fiscalizatórios impostos a órgão da Administração Pública, violando, com isso, a separação dos poderes e invadindo o regramento de matéria de iniciativa privativa da Chefia do Poder Executivo local.
Pareceres contrários
Ao longo do processo legislativo, o texto legal, ao final aprovado em Plenário da Câmara Municipal, havia sido rejeitado pela Procuradoria-Geral, pela Comissão de Justiça, Legislação e Redação e ainda pela Comissão de Direitos da Criança, todos indicando inconstitucionalidade formal e material da proposta.
O defensor público Paulo Cesar Azevedo de Almeida, da Coordenadoria Estratégica em Tutela Coletiva (CETUC) e um dos autores da petição, observa que a Defensoria Pública tem como atribuição trabalhar em prol de grupos vulnerabilizados. Por isso, para além do perfil socioeconômico das pessoas assistidas pela DPMG, é também dever da instituição fazer a defesa de coletividades que, por razões estruturais, históricas e socioculturais, são vítimas de discriminação, como é o caso comunidade LGBTQIA+.