A ocupação de terrenos públicos faz parte da história de crescimento e urbanização das metrópoles brasileiras. Em Belo Horizonte a situação não é diferente. Entre outros casos semelhantes, a Defensoria Pública de Minas Gerais tem se empenhado para garantir o direito à moradia de seis famílias que residem no bairro Padre Eustáquio, na região Noroeste da Capital.
Há mais de 35 anos os imóveis, que ficam às margens da Avenida Teresa Cristina, foram desapropriados pelo Estado para a construção do Viaduto Ulisses Guimarães.
Os imóveis, que servem de moradia para seis famílias, foram reivindicados pelo Estado e, desde 2011 um processo de reintegração de posse corre na Justiça. Em fevereiro de 2022 o Tribunal de Justiça emitiu parecer favorável ao Estado e autorizou a reintegração da área.
No entendimento da defensora pública Cleide Aparecida Nepomuceno, que atua na Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais (DPDH) e está cuidando da defesa dos moradores, as famílias possuíam direito à concessão especial de uso para fins de moradia prevista na Medida Provisória 2220/2001.
A norma disciplinou o instituto da Concessão de Uso Especial para Moradia (CUEM) em bens públicos. O parâmetro básico para sua incidência é a posse ininterrupta e sem oposição de terrenos públicos, em área urbana, com finalidade de moradia.
A Justiça, porém, deu ganho de causa para o Estado com base na súmula 619 do Superior Tribunal de Justiça, cujo enunciado diz: “A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias”, ou seja, não é admitida a posse privada, apenas a mera detenção do bem.
Segundo Cleide Nepomuceno, “apesar de a Defensoria Pública ter sustentado o direito das famílias à CUEM, prevista na Medida Provisória 2220/2001, esse instrumento legal foi ignorado pela sentença que se limitou a repetir o argumento de que os bens públicos são insuscetíveis de posse.
O processo ainda está na fase recursal. Para a defensora pública, “a súmula ilustra o descaso da jurisprudência com os direitos sociais das pessoas marginalizadas e a dificuldade de efetivação do direito à moradia e dos instrumentos de regularização fundiária, especialmente, em áreas públicas”.
Ela acrescenta que o “direito à moradia está inserido no contexto de um sistema no qual os espaços urbanos dotados de infraestrutura são uma mercadoria acessível apenas a uma parcela da população que pode pagar por ela. Ao restante, que também necessita morar, restam os locais que não se prestam para o mercado, entre eles os terrenos públicos que acabaram sendo objeto de ocupação para fins de moradia por parte de pessoas hipossuficientes de forma organizada ou espontânea”.
Os moradores poderão ser despejados a qualquer tempo. A família de Carolina Cardoso Teixeira Santos é uma das que vivem esse temor. Ela era criança na época que seu pai comprou o imóvel. “Desde então, sempre moramos aqui e agora teve essa ordem de despejo”. Carolina mora com a mãe e três irmãos menores.
A Defensoria Pública mineira está buscando a inserção das famílias em políticas públicas de aluguel social e tentando um prazo para que elas possam organizar a saída do imóvel.
A Defensoria acompanha ações contra as seguintes ocupações em Belo Horizonte: Ocupação Padre Eustáquio, Anita Santos, Santa Catarina, Vila Esperança, Maria, Fábio Alves e Papoula Beatriz. Nessas áreas estão 1.760 famílias que estão sendo defendidas pela DPMG.
Além destas, a instituição acompanha processos de reintegração de posse ajuizados pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e Ferrovia Centro-Atlântica (FCA).
Alessandra Amaral – Jornalista/DPMG.