STF acolhe habeas corpus da Defensoria Pública de Minas e determina soltura de mulher presa há cem dias por furto de água

Por Assessoria de Comunicação em 18 de novembro de 2021

Cotidianamente, na atuação de defensoras e defensores públicos, a prerrogativa da Defensoria Pública de requisitar documentos públicos não sigilosos faz valer a lei e os direitos dos mais vulneráveis.

Um caso emblemático resolvido pela Defensoria de Minas Gerais exemplifica bem a importância da prerrogativa, que está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesta atuação, a obtenção de uma certidão de nascimento de uma criança foi decisiva para a defesa de uma mãe vulnerabilizada.

Entenda

Em outubro, durante inspeção de rotina no pavilhão feminino da Penitenciária Uberlândia I, a defensora pública Alessa Pagan Veiga identificou a situação de uma mulher, mãe de uma criança de cinco anos, que estava presa há três meses, sob acusação de ter furtado água.

A diarista foi presa na frente do filho, em julho, em uma casa de uma cidade no interior de Minas. Segundo a polícia, ela e o companheiro violaram o lacre da instalação de água do local onde a família vivia de favor.

De acordo com o Boletim de Ocorrência, por um mês a família usou a água disponibilizada pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) sem pagar pelo consumo.

Em junho, dois agentes da Copasa visitaram a casa e constataram que a família tinha violado o hidrômetro da residência. Os funcionários lacraram a instalação novamente, interrompendo o fornecimento de água. Um mês depois, os fiscais retornaram e, segundo eles, o lacre havia sido rompido de novo. Eles contam que chamaram a Polícia Militar depois de terem sido xingados pela diarista e seu companheiro.

Em depoimento, a diarista disse que voltava com o filho para casa quando encontrou uma viatura no local. Ela tentou fugir com a criança no colo quando soube que seria levada à delegacia por furto de água.

Segundo ela, os policiais chegaram a dizer que ela estaria embriagada e a sugerir que teria feito uso de drogas. Indignada pelas afirmações e desesperada por ficar sem água, “que era usada para cozinhar para a criança”, a diarista, conforme o BO, teria se exaltado e esboçado agressividade, proferindo palavras de baixo calão.

A defensora pública Alessa Veiga salienta que “foi uma reação espontânea e justificável de uma mãe muito pobre, que ficou desesperada ao ser presa na frente do filho por furto de água”.

Na versão da diarista no BO, ela afirma que agiu assim pois o proprietário da casa, que tinha deixado eles ficarem no imóvel, mandou cortar a água com eles no local. Além disso, esclareceu que não poderiam ficar sem água, visto que têm uma criança de cinco anos. Disse que foi seu companheiro quem rompeu o lacre no cano de água porque a família não tinha como pagar a conta no momento.

Ambos foram presos em flagrante.

O Ministério Público de Minas Gerais pediu o relaxamento da prisão do homem, alegando que o crime não era violento. Ele foi solto logo depois.

Já para a diarista o MPMG solicitou prisão preventiva, citando como agravantes o suposto desacato aos policiais, a resistência à prisão e reincidência.

O processo tramita em Estrela do Sul, no Triângulo Mineiro, e a diarista está sendo defendida pela Advocacia Dativa. Tanto o Tribunal de Justiça de Minas Gerais quanto o Superior Tribunal de Justiça já haviam negado a prisão domiciliar devido à falta da certidão de nascimento da criança, mesmo com ela estando arrolada no BO.

Em uma decisão de 2018, o Supremo Tribunal Federal determinou a substituição da prisão preventiva por domiciliar de mulheres presas, em todo o território nacional, que sejam gestantes ou mães de crianças de até 12 anos ou de pessoas com deficiência, sem prejuízo da aplicação das medidas alternativas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).

Pedido de ajuda

Durante a inspeção da DPMG na penitenciária, a diarista pediu ajuda para a defensora pública Alessa Veiga. “Ela me entregou um bilhete, dizendo que estava presa há três meses por furto de água e que seu filho tinha ficado com a irmã mais nova, que é adolescente e vive em outra cidade. A Justiça prendeu a mãe e o companheiro e não se preocupou com que aconteceria com o filho”, conta.

Na condição de custus vulnerabilis, Alessa Pagan entrou com um pedido de habeas corpus no STF, com base no princípio de insignificância (quando o valor do objeto furtado é tão irrisório que não causa prejuízos à vítima).

“É um absurdo uma mãe ficar cem dias presa por furto de água, um crime não violento. Ela me disse que queria pagar a conta, mas não tinha dinheiro. É uma família muito pobre, usava a água para cozinhar para o filho, para beber, tomar banho… eles viviam de favor, em uma casa minúscula. Será que a prisão era a melhor solução para esse caso?”, pondera a defensora.

Decisão

Nesta quarta-feira (17/11), o ministro Alexandre Moraes, do STF, ordenou a soltura da mulher.

Para o ministro, o furto não é suficiente para a decretação da prisão preventiva. Ele autorizou, no entanto, que a Justiça de Estrela do Sul aplique as medidas cautelares que julgar cabíveis, como a necessidade de comparecer em juízo periodicamente, uso de tornozeleira eletrônica, proibição de frequentar determinados lugares, de se ausentar da cidade em que vive, entre outras.

“A natureza do crime imputado, praticado sem violência ou grave ameaça, aliada às circunstâncias subjetivas da paciente (mãe de uma criança de cinco anos de idade), está a indicar que a manutenção da medida cautelar extrema [a prisão] não se mostra adequada e proporcional”, disse o ministro.

Alessa Veiga explica que, pela Constituição da República, qualquer cidadão pode impetrar um HC e que foi essencial no caso a prerrogativa de requisição da Defensoria Pública.

“Só ganhamos no STF porque conseguimos a certidão. A prerrogativa é fundamental em casos como esse, em que a família é tão pobre que não tinha nem a certidão de nascimento do filho”, finalizou.

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